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quarta-feira, agosto 04, 2004

Tertúlias às terças 

Imaginem um grupo daqueles que achamos culturalmente ignorantes, drs e não drs pouco esforçados e nada interessados, empregadas da limpeza, pedreiros, homens do lixo, ... sentados a uma mesa a discutir qualquer outra coisa que não futebol ou telenovelas.

A imagem não parece muito apelativa.

Imaginem agora um grupo daqueles que achamos culturalmente iluminados, críticos de cinema, comentadores políticos, diletantes da vida que de tudo um pouco falam, jornalistas-escritores-professores-chefes-faztudos, ... - intelectuais a quem chamamos pseudo - sentados também a uma mesa a comentar a corrente existencialista e a qualidade poética do novo filme de Lionel Vieira, a localização geográfica da estação de tratamento de águas residuais da zona de influência do Parque Natural da Ria Formosa, a relevância do modelo dos submarinos a serem comprados pelo Ministério da Defesa e o plano de financiamento que deve ser negociado.

Uma visão quase tão pouco apelativa como a anterior.

Peço-vos apenas mais um esforço. Peço-vos que imaginem ainda, e por último, de novo um grupo sentado a uma mesa, mas desta feita composto por jovens adultos seguros de si, das suas capacidades, recusando a carapuça da pseudo-intectualidade, falando de igual para igual não com ou para aqueles a que chamam intelectuais mas sim deles. Criticando sem restrições a sua soberba e distanciamento da vida curriqueira, e a força da voz que a sociedade lhes dá.
Criticando também os ignorantes pela sua estupidez e o sistema por os criar.

Falando sempre "neles". Eles isto. Eles aquilo. São sempre assim. Fazem sempre assado. Acham sempre frito.

Eles são os outros. Todos que não eles. E enquanto falam, debitam incessantemente os nomes dos intelectuais que criticam, os livros ou artigos que leram e que são inqualificáveis, os programas para ignorantes que não vêem mas espreitam para poder comentar, o sistema que está todo mal e as melhores soluções para problemas que eles, que são gente normal sabem resolver muito melhor que os outros porque se interessam e porque estudaram e porque os intelectuais falam do que não sabem.

Enquanto isto, pensam de si para si: sou mesmo bom, qualquer dia vou ser tão reconhecido como aquele ou o outro intelectual e vamos ser amigos e já não vou poder dizer mal dele. Nunca lá chegam, mas cagam sentenças ainda com maior propriedade.

Esta é sem dúvida a pior das visões!

Preocupada tento encontrar uma outra mesa com um outro grupo. Reparo que já estou sentada. Olho para o grupo à minha volta e tento identificá-lo, identificar-me... esperançada numa conclusão que me integre numa outra categoria. Dou por mim a dizer essas mesmas coisas, olho para o lado e ouço-as como um eco.

É triste esta nossa condição. Para quem já inventou uma terceira via, não devia ser muito difícil pensar numa quarta...

O melhor mesmo é ficar na praia, comer gelados e não pensar mais no assunto. Alguém com certeza o fará...
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